quarta-feira, agosto 03, 2016


Será que nada muda nada?



   Estas linhas objetivam uma sucinta reflexão sobre a possibilidade de uma ação política efetivamente transformadora e reformadora após os últimos escândalos políticos, envolvendo diversos partidos brasileiros, dentre os quais podemos destacar o PMDB, PSB, SDD, PTB, PP, PSDB e também o Partido dos Trabalhadores.

   A estrutura do movimento de ascensão e queda do PT não é muito distinta da estrutura das antigas tragédias gregas. O herói trágico, que precisa necessariamente ser um mortal como os demais, alcança, depois de uma árdua luta contra forças que aparentemente lhe eram muito superiores, a posição mais elevada dentro da hierarquia social, como nos casos de Édipo e Lula.

   Depois de um breve período de plena felicidade, a tragédia se configura quando o herói se dá conta de que, apesar de sua firme intenção de não cometer os erros a que estava predestinado, ele acaba de qualquer jeito por cometê-los. A tragédia, nessa concepção tradicional, alcança o ápice no momento que Aristóteles chamava de “momento do reconhecimento”, em que o herói se dá conta de que as estruturas que o próprio fato de sua ascensão havia aparentemente subvertido na verdade estiveram operantes ao longo de todo o seu percurso, determinando-lhe os passos sem que ele pudesse ter consciência disso. Assim como Édipo, nesse momento, aparece a si próprio como uma marionete do Destino, ou, numa chave de interpretação psicanalítica, de seus desejos inconscientes, Lula, aparece como a marionete de uma estrutura política, social e econômica que só ratificou o seu poder ao permitir que esse ex-operário chegasse a ocupar a presidência da República.

   A questão com a qual a queda do PT irremediavelmente nos confronta é a seguinte: se nem mesmo Lula, Dilma e os partidos de esquerda aglutinados em torno do PT foram capazes de alterar as estruturas seculares que respondem pela desigualdade social no Brasil, se até mesmo um partido de esquerda, para chegar ao poder e exercer o poder, precisou se “endireitar”, reproduzindo as mesmas velhas práticas que sempre combateu, será que o Brasil está fadado a ser o “país do passado” que sempre foi, um país escravocrata dominado por uma pequena elite que só se ocupa em perpetuar os seus antigos privilégios?

   Se mesmo figuras quase míticas da resistência ao poder constituído sucumbiram diante desse mesmo poder no momento em que o tiveram nas mãos, será que alguém é capaz de efetivamente transformar o que quer que seja?

     Em suma: até que ponto podemos superar essa melancolia que, como uma nova peste, ameaça arrastar-nos todos à convicção niilista de que nada muda nada, à convicção de que nenhuma ação política racionalmente articulada tem o poder de alterar substancialmente as estruturas seculares do nosso Brasil?