Repousa a cidade envolta em manto escuro.
Messalina febril, exausto o seio impuro,
Tombou por sobre o leito, hedionda, escalavrada.
Neste momento são três horas da madrugada.
A noite é fria; o céu é baço.
Os montes vão vestindo as armaduras de aço.
Silêncio sepulcral! Mudez que não se exprime!
É o silêncio que segue as convulsões de um crime.
O silêncio tem voz; a noite tem olhar.
Há sonhos pela terra, há sonhos pelo ar.
A noite do remorso anda espreitando a vida
Pela porta da alma; e a alma espavorida
Vacila, quer fugir, tem medo, está confusa
O infinito esmaga; a solidão acusa...
Dormir, não pode ser; a alma nesse instante
É como um olho aberto, imóvel, flamejante,
A quem alguém cortasse a pálpebra sombria.
Escuta pelo ar uma risada fria...
Vê gênios infernais, ocultos no arvoredo,
Que estão falando dela e rindo-se em segredo...
Vê olhos a fitá-la, ardentes como brasas,
E monstros que ao passar vão sacudindo as asas...
Fica febricitante, alucinada, exangue,
Vai beber na fonte, ei-la mudada em sangue.
Passa por uma ruim; exausta de canseira.
De uma pedra sai-lhe uma caveira!
Apavorada, foge pelas montanhas,
E põe-se a cantar alto umas canções estranhas,
Grotescas, doidas, alucinadas,
Como alguém que tem medo ao ir pelas estradas...
Mas tudo, tudo em vão! Não pára, não descansa!
É pantera que leva o ferro pontiagudo duma lança
Cravada no peito; estorce-se, procura
Um refúgio, um atalho, uma caverna escura,
Mas sempre adiante dela a caçadora feroz,
Aquela dentro de cada um de nós,
A Consciência!... Cai; fica a tremer de susto;
O canto duma ave, a sombra de um arbusto,
O murmúrio do mar, o soluçar do vento,
Um eco, um som, a noite, a luz, o pensamento,
Tudo lhe causa medo! É como a criancinha
Que derpertou na treva e que se viu sozinha.
Mergulham no infinito as espirais dos sonhos!
Passam-lhe pelo corpo uns arrepios medonhos...
Quer dormir, quer morrer! Atira-se aos abismos;
Tomba, esperneia e se debate em doidos paroxismos,
Vai descendo, descendo... o imenso não tem fundo...
De quando em quando, encontra um grão de areia -
- um mundo,
E quanto mais mergulha, despenca e desce,
Mais aumenta o pavor, mais a distância cresce!
O nada não existe! Horror, horror sublime!
Não pode descansar o coração do crime!
Diz ela: Não poder em toda a eternidade
Aniquilar-me um dia! O espírito, a vontade,
Nunca poder dormir... Sempre com a mente alerta!
A memória! A memória, essa janela aberta,
Por onde a alma vê todo o passado escuro!
Fugir? Mas para onde? A sombra do futuro
É mar que não tem praia, é noite sem guarida!...
Morrer! Para que serve! A morte é o prólogo da vida!
Messalina febril, exausto o seio impuro,
Tombou por sobre o leito, hedionda, escalavrada.
Neste momento são três horas da madrugada.
A noite é fria; o céu é baço.
Os montes vão vestindo as armaduras de aço.
Silêncio sepulcral! Mudez que não se exprime!
É o silêncio que segue as convulsões de um crime.
O silêncio tem voz; a noite tem olhar.
Há sonhos pela terra, há sonhos pelo ar.
A noite do remorso anda espreitando a vida
Pela porta da alma; e a alma espavorida
Vacila, quer fugir, tem medo, está confusa
O infinito esmaga; a solidão acusa...
Dormir, não pode ser; a alma nesse instante
É como um olho aberto, imóvel, flamejante,
A quem alguém cortasse a pálpebra sombria.
Escuta pelo ar uma risada fria...
Vê gênios infernais, ocultos no arvoredo,
Que estão falando dela e rindo-se em segredo...
Vê olhos a fitá-la, ardentes como brasas,
E monstros que ao passar vão sacudindo as asas...
Fica febricitante, alucinada, exangue,
Vai beber na fonte, ei-la mudada em sangue.
Passa por uma ruim; exausta de canseira.
De uma pedra sai-lhe uma caveira!
Apavorada, foge pelas montanhas,
E põe-se a cantar alto umas canções estranhas,
Grotescas, doidas, alucinadas,
Como alguém que tem medo ao ir pelas estradas...
Mas tudo, tudo em vão! Não pára, não descansa!
É pantera que leva o ferro pontiagudo duma lança
Cravada no peito; estorce-se, procura
Um refúgio, um atalho, uma caverna escura,
Mas sempre adiante dela a caçadora feroz,
Aquela dentro de cada um de nós,
A Consciência!... Cai; fica a tremer de susto;
O canto duma ave, a sombra de um arbusto,
O murmúrio do mar, o soluçar do vento,
Um eco, um som, a noite, a luz, o pensamento,
Tudo lhe causa medo! É como a criancinha
Que derpertou na treva e que se viu sozinha.
Mergulham no infinito as espirais dos sonhos!
Passam-lhe pelo corpo uns arrepios medonhos...
Quer dormir, quer morrer! Atira-se aos abismos;
Tomba, esperneia e se debate em doidos paroxismos,
Vai descendo, descendo... o imenso não tem fundo...
De quando em quando, encontra um grão de areia -
- um mundo,
E quanto mais mergulha, despenca e desce,
Mais aumenta o pavor, mais a distância cresce!
O nada não existe! Horror, horror sublime!
Não pode descansar o coração do crime!
Diz ela: Não poder em toda a eternidade
Aniquilar-me um dia! O espírito, a vontade,
Nunca poder dormir... Sempre com a mente alerta!
A memória! A memória, essa janela aberta,
Por onde a alma vê todo o passado escuro!
Fugir? Mas para onde? A sombra do futuro
É mar que não tem praia, é noite sem guarida!...
Morrer! Para que serve! A morte é o prólogo da vida!