segunda-feira, setembro 26, 2011


Silêncio em dó menor


Misteriosa expressão da alma das coisas mudas,

Silêncio — imensidão dos enigmas em aberto,

espelho baço trincado onde a tristeza universal se estampa.

Silêncio — de onde brota lá do fundo outro silêncio, na fermentação das dores cruéis, agudas,

solene senhor da treva e noites escuras.

Silêncio — abissal e insondável oceano,

tudo quanto nos teus abismos vive imerso,

tem a secreta voz rouca dos rochedos e o grito histérico das loucas.

És a concentração desconcertante do ser pensante, demasiado humano,

a vida de outros planos e oculta do universo,

a energia invisível das coisas.



Seja engano, talvez, delírio do meu cérebro enfermo,

mas eu compreendo os teus sentimentos profundos

eu te sinto nas anônimas odisséias.

Foste o início de tudo e de tudo és o termo.

Silêncio — concepção primitiva dos mundos,

cosmogonia eteral de todas as idéias.

Silêncio — morna solidão de sintomas medonhos,

pântano negro onde do mal desenvolvem-se os vermes

fonte da inspiração, rio da ausência do som do esquecimento,

lago de saliva da boca sem língua, copo sujo em cujo fundo os demônios dos meus sonhos

postos lado a lado, inanimes, inermes,

fitam de estranho ideal o fulgor opulento.

Ò Silêncio! Ò visão abstrata subjetiva da Morte!

— refúgio passional que eu sempre busco e anseio

hei de recordar . . . as torturas, tonturas e vidas tortas,

pois fazes com que ao teu influxo eu me transporte

ao seio da saudade do leite venenoso, a esse funéreo seio

- esquife onde revejo as ilusões já mortas.