sexta-feira, julho 08, 2016



Balada dos Cãotribuintes


Somos nós os desventurados
Os pobres contribuintes
Obrigados a sofrer até ao fim dos tempos
A sorte a que imper
A que impertubáveis
Nos condenam os nossos governos
Todos os nossos governos

Se meteres cem francos de gasolina
Oitenta vão para o Estado
Olha cheio de concupiscência
Os Cadillac... Olha pra outro lado
No teu dois cavalos de brincar
Saltita ao longo dos caminhos
É uma sorte poderes circular
Amanhã vão-te proibir
Taxa sobre o álcool e a cerveja
Sobre os definitivos e os provisórios
Sobre o triste celibatário
Castigado por ser só um
Controlam-te todos os passos
Ah compraste um belo naco
Tudo corre às mil maravilhas
Paga guloso paga pro saco

Refrão

Numa bandeja o Estado dá-te
Um prato... apanhas um desgosto
Está vazio E tu admiras-te
Mas é o prato do imposto
Tu passeias pela vida
De peito feito cheio impante
Cuidado com o imposto sobre a energia
É para ontem... ou mesmo antes
Um belo dia sobre o oxigênio
Ligar-te-ão o contador
Tarifa simples o ar do Sena
Tarifa dupla o ar da serra
Eis porém que tu te fartas
Preferes andar aos caídos
Ou tornar-te engolidor de facas...
Taxa de engolidor acrescentada

Refrão

Um remédio o casamento
Dizes de súbito e corres
A procura de uma rapariga séria
Que saiba de amor e de comes
Apressas-te e calculas
Que ao fim de doze filhos o abono
Do teu rendimento minúsculo
Compensará a escassez
Mas um inspetor das Finanças
Põe-se a badalar a ideia
E pare... sem dor por minha fé
Um texto cheio de veia
Então a Câmara classifica-te
Como garanhão de cobrimento
Medem-te e tens a mais
Pagas taxa sobre o comprimento

Refrão

Se pagasses para alguma coisa
Sempre tinhas uma justificação
Mas infeliz daquele que ousa
Perguntar pr'onde vai o cifrão
Temos estradas miseráveis
Não há escolas mas padres
Acabou o bom vinho há carrascão
Mas fornecem-nos o purê
O governo da França
Republicano — ou que assim diz que é —
Só um prato oferece com abastança
O frango... pilim para o arroz
E para evitar a falência
Dos pobres vendedores de canhões
Faz-se uma guerra do pé para a mão
A guerra não se diz que não...

Mas nós os pobres cães os pobres contribuintes
Virá um dia em que de pau em punho
Nos consolaremos a limpar o redil
Onde os nossos seiscentos porcos estão maduros para o enchido


Boris Vian, in "Canções e Poemas"

Tradução de Irene Freire Nunes / Fernando Cabral Martins