quarta-feira, dezembro 16, 2009


O OLHO DO DIABO

Diz a lenda do meu pago
Quando a coisa fica preta
Tem o olho do capeta
Entreverado no meio
E o gaudério com receio
Não percebe pela prosa
Que o Diabo é a língua venenosa
De quem deseja o mal alheio.


Dizem que tem o olho do Diado
Quando o gaúcho vai mal
E não há freio ou buçal
Que atalhe tal perigo
Por perto ronda o inimigo
Com inveja e mau olhado
E o peão mal informado
Pensa que é praga ou castigo.

E às vezes pela invernada
Quando encontra uma rês doente
O peão de boa fé pressente
Que o capeta por ali anda
E a tropa que ele comanda
Com cuidado e muito sério
Até parece mistério
Sem motivo ela debanda.

Quando nas lides da vida
Os negócios não dão certo
Dizem que o Diabo está por perto
Distribuindo quebranto
Causando o maior espanto
A inveja, o mau olhado
E o gaudério apavorado
Apela até pro Pai de Santo

Mas o Diabo ou capeta
Não são coisas do outro mundo
É a língua dos vagabundos
Que só pensam em falsidade
E o Diabo fica à vontade
Até dá pulo de contente
Quando encontra nesta gente
Só ódio, inveja e maldade.

O Diabo é cada pessoa
Que vive fazendo o mal
Mas um gaúcho bagual
Que tem Deus Pai a seu lado
Pra inveja e mau olhado
E pra um linguarado afoito
Só uma bala de trinta e oito
Na boca do desgraçado.

O olho e a língua do Diabo
Que certos por aí têm
Jamais fará mal a alguém
Porque esta gente não presta
E um bom gaúcho detesta
Covarde e mal encarado
E a marca do gaúcho honrado
Traz estampada na testa.

Quem vive fazendo o mal
E não respeita o semelhante
É canalha ignorante
E não enxerga o próprio rabo
É cascavel, bicho brabo
Pois só maldade ele sente
Cuidado com este vivente
É ele o OLHO DO DIABO.





O VINHO

Eu acreditava que o fruto da vinha era meu amigo sincero,

mas eis que,

tal uma víbora,

ele me morde e me faz delirar.

Eu o amo e eis que ele me engana perfidamente,

seduzindo meu coração e meu espírito.

Eu o destinava a ficar sob o domínio de minhas entranhas e

eis que ele se afoita a arrebatar o domínio da minha cabeça.

terça-feira, dezembro 15, 2009


APRISIONADO OU NÃO!?


Qual é a dor aprisionada neste corpo?

Solene sorriso se reflete em refrões...
Em tríplices imagens contidas
luas que se esgueiram cativas.

Qual é a verdade aprisionada neste laço?
Que não se desfaz, que não se desintegra?
Que a areia não cobre, que a onda não leva?
Vermes recusam a digestão.

Qual é o presente preso neste passado?
Que se faz de inocente, quase sem pecado.
Que se pronuncia veemente, inerte, macabro.
Vampiro diurno de sangue manchado.

Qual é a vantagem presa nesta opressão?
Opressivo momento que não vai embora
Lascivo, descrente, preciso, escória
permanente, resoluto na mesma história.

Sacode este tempo, desfaz este chão.
Liberta este vento, depreda o grilhão.
Não existe caminho que una o separado.
Colore a retina. Destrava teus passos.

E vai...


O CÁRCERE

Que vim eu aqui ver!? Uma masmorra
Úmida, estreita, onde respiro apenas!
Se a fronte elevo, o negro teto;
Se estendo os braços, a largura abranjo;
dois passos bastam para medir seu fundo.

Que vim eu aqui ver!? Nomes escritos
De um lado e de outro de centenas de homens,
Que como eu curiosos peregrinos
vieram visitar este recinto.

Vós, meus olhos, nada vedes;
Mas minha alma no passado,
um vate vê encerrado
Nesta lúgubre prisão;
Aqui chorou longos dias,
longas noites, longos anos,
Quem por olhos soberanos,
Enlouqueceu de paixão.

CARA SEM OLHOS


Sem olhos vi o mal claro

Que dos olhos se seguiu,

Pois cara sem olhos viu

Olhos que lhe custam caro.

De olhos não faço menção,

Pois quereis que olhos não sejam;

Vendo-vos, olhos sobejam,

Não vos vendo, olhos não são.

segunda-feira, dezembro 14, 2009

Morte

Silenciosa madona da tristeza,

A morte abriu-me as catedrais radiosas,

Onde pairam as formas vaporosas

Do país ignorado da Beleza.

Num dilúvio de lírios e de rosas,

Filhos da luz de uma outra Natureza,

Que entornavam no espaço a sutileza

Dos incensos das naves harmoniosas!

Monja de olhar piedoso, calmo e austero,

Que traz à Terra um tênue reverbero

Da mansão das estrelas erradias...

Irmã da paz e da serenidade,

Que abriu meus olhos na Imortalidade,

À esperança de todos os meus dias!

Semeadura

“Mas, tendo sido semeado, cresce.”

– JESUS. (MARCOS, 4:32.)


É razoável que todos os homens procurem compreender a substância dos atos

que praticam nas atividades diárias. Ainda que estejam obedecendo a certos

regulamentos do mundo, que os compelem a determinadas atitudes, é

imprescindível examinar a qualidade de sua contribuição pessoal no mecanismo

das circunstâncias, porquanto é da lei de Deus que toda semeadura se desenvolva.

O bem semeia a vida, o mal semeia a morte. O primeiro é o movimento evolutivo

na escala ascensional para a Divindade, o segundo é a estagnação.

Muitos Espíritos, de corpo em corpo, permanecem na Terra com as mesmas

recapitulações durante milênios. A semeadura prejudicial condicionou-os à chamada

“morte no pecado”. Atravessam os dias, resgatando débitos escabrosos e

caindo de novo pela renovação da sementeira indesejável. A existência deles constitui

largo círculo vicioso, porque o mal os enraíza ao solo ardente e árido das paixões

ingratas.

Somente o bem pode conferir o galardão da liberdade suprema, representando a

chave única suscetível de abrir as portas sagradas do Infinito à alma ansiosa.

Haja, pois, suficiente cuidado em nós, cada dia, porquanto o bem ou o mal,

tendo sido semeados, crescerão junto de nós, de conformidade com as leis que

regem a vida.

Fonte: XAVIER, Francisco Cândido. Caminho, Verdade e Vida. 1. ed. especial. Rio de Janeiro: FEB, 2005,

cap. 35, p. 85-86.

Viagem à Luz

PAULO NUNES BATISTA

Recolhe, humildemente, a mão mendiga,

sem óbolo, sequer, da caridade.

O que semeaste pela eternidade,

para teres, agora, a mão amiga?

Despe, teu ser, dessa Amargura antiga

e veste-o de Ternura e de Bondade.

As auras puras da Fraternidade

tornam feliz toda a alma que as abriga.

Toda colheita teve semeadura:

amargo, é sempre fruto de Amargura,

o terno é, da Ternura, resultado...

Nessa Viagem à Luz, que ora empreendo,

embora não me entenda, asas estendo

e vôo para a Luz, iluminado.

O AMOR

Os profundos e negros amargores
Em que eu mergulho a vida, inexperiente,
Não tem nem luz, nem sol, nem sons, nem flores....
Unicamente lágrimas e dores,
Vácuo, sombras e luto constantemente...
Feliz de quem não sofre, nem os sente!
É tão amargo o mel destes amores
Que de goza-los, fico descontente
E sinto que me inundam de repente
Os profundos e negros amargores provocadores das mais lacinantes dores.

Da vida o espinho agudo e pungitivo
Quanto se é mais feliz, mais fundo crava,
Acelera o sangue quente e ativo...
E nada lava o golpe fundo e vivo,
Essa aberta ferida nada lava!
É preciso livrarmos a alma escrava
E libertar o coração cativo,
Quando nos vem o amor, que é doce e trava,
Abre-se o golpe, e o golpe mais agrava
Da vida o espinho agudo e dolorido.

O amor a toda natureza encanta,
É como o som da música inspirada,
Tudo que sobre o globo ruge e canta,
Seja fera ou planta,
E essa aventura sempre desejada,
Gozar!Gozar! As vezes é TUDO, as vezes é NADA.





VIRGEM

Tu, por Deus entre todas escolhida,
Virgem das virgens, Tu que do assanhado
Tartáreo, monstro que com Teu pé sagrado,
Esmagaste a cabeça entumecida.

Doce abrigo, Santíssima guarida,
De quem Te busca em lágrimas banhado,
Corrente com que as nódoas do pecado,
Lava uma alma, que geme arrependida.

Virgem de estrelas nítidas coroada,
Do Espírito, do Pai, do Filho Eterno,
Mãe, filha, esposa, e mais que tudo amada.

Valha-me o teu poder e amor materno,
Guia este cego, arranca-me da estrada,
Que vai parar no tenebroso inferno.


G:.S:.A:.U:.

Filho, Espírito e Pai, três e um somente.
Que extraiste do caos, do pó, do nada
O sol dourado, a lua prateada
O racional, e irracional vivente.

Eterno, justo, imenso, onipotente
Que ocupas essa abóbada estrelada
Grande Ser Arquiteto do Universo, de cuja força ilimitada
A máquina do tempo está pendente.

Tu, que, se queres furacão violento
Tempestade feia, nuvem escura
Desatas, e subjugas num momento.

Criador, que remiste a criatura
Quebra o furor do temido elemento
Que nos abre no inferno a sepultura!

Enquanto

Enquanto há céu azul para teus olhos,

Deixa que a luz de Deus te ajude e guarde

E reflete-lhe as bênçãos para a vida,

Antes que seja tarde.

Enquanto o pensamento claro e belo

Em teu cérebro puro vibra e arde,

Cultiva a idéia nobre e redentora,

Antes que seja tarde.

Enquanto moves tuas mãos robustas,

Estende o bem, servindo sem alarde.

E ampara a todos, generosamente,

Antes que seja tarde.

Enquanto a boca lúcida te exprime,

Foge à treva maligna e covarde

E esquece o verbo deturpado e louco,

Antes que seja tarde.

Embora a dor e o pranto, não permitas

Que a tua fé sublime se abastarde...

Abraça a luta e segue para a frente,

Antes que seja tarde.

Não olvides que o túmulo te espera

Sem que a pompa terrena te resguarde.

E busca em Cristo a Vida Soberana,

Antes que seja tarde.

João Coutinho

Fonte: XAVIER, Francisco Cândido. Poetas Redivivos, cap. 96,

3. ed. FEB, p. 135-136.


INOCÊNCIA


O meu olhar é nítido como um Sol.
Tenho o costume de andar pela rua
Olhando para a direita e para a esquerda,
E olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender...

O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...

Eu não tenho filosofia; tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar...

Amar é a eterna inocência,
E a única inocência não pensar...

FAZER AMOR

fazer amor requer arte inconsciente

fazer amor transcende o feio e o bonito

fazer amor requer a alma despida

fazer amor transcende a sexualidade



fazer amor é ignorar todos os conceitos formais da humanidade

e se entregar como quem se doa a si mesmo

fazer amor não tem vínculo algum

com o lado físico dos seres

fazer amor é uma divindade.

divindade que advém do mais nobre dom da vida : a própria vida.



fazer amor é enlouquecer a anatomia.

não importa a forma.

o que importa é não importar com coisa nenhuma.



fazer amor é fazer de inconcebíveis palavrões um lindo poema.

fazer amor é fazer do corpo um banquete de sonhos

e fazer da alma o berço do gozo...




HAPPY END - VADE MECUM (VemComigo!)

O poeta é um fingidor
Finge que está dormindo
Finge que está fingindo
Finge que sente dor
Sente que está fingindo
Mas não finge seu amor.

Mente que não sente
Apenas por rancor
Poeta afinal, não é gente como a gente!?
será mesmo que ele não sente dor?
Aposto que ele finge que não é diferente
Mas sabe-se lá realmente o que estes seres sentem ou quanto normalmente
é plausível alguém achar ou fingir ser possível um final feliz.

O fim de algo pode ser feliz?
O poeta diz que sim.

Acreditem nele ou não! Eu já tenho a minha opinião!
mas preste bem atenção!
Não quero lhe induzir
Persuadir do que é certo ou não
Já disse! Tenho minha opinião
acredite no que quiser acreditar
No que lhe dizem
No poeta
Ou alguém mais
Na voz ao pé do ouvido
as vezes em quem paga mais.

"-Não! -Não!"

Você aí grita: "- Quem é você afinal?
-Eu acredito em quem me provar
-Eu acredito no que está escrito no jornal!
-Amor tem que provar
e estampar na primeira página
tipo àquelas notas publicadas que comunicam Fulano e Fulana vão casar.
Ou na coluna social: X e Y casaram no dia zero , em uma linda cerimônia realizada na Igreja B+
e receberam os convidados em uma festa chiquérrima no Hotel King 666, o único 1001 estrelas mundo.
- Amar é também casar!"

O poeta neste momento, finge chorar
E pede: "- Não esperem eu ir embora, para então, enfim, perceberem
Que amar não tem relação com casar
Amar não precisa provar
E acreditem no quiserem acreditar
Ou no que lhes faça mais feliz."

Alguém grita novamente: "Ei! Quem é esse poeta e de onde vem esse infeliz!?."

O próprio responde:
"Sim, já sei de onde vim
Devoro-me como a chama insaciável
Tudo o que toca as minhas mãos se torna luz
E o que lanço não é mais que carvão
Certamente sou uma chama!
O que ainda tramo o que
ainda clamo
o que ainda amo traz a
mesma chama
sinto-me salivado pelo verbo,
rodeado de presenças e mensagens
de santuários falhados e de quedas,
de rosários enozados, de obstáculos, de limbos e de muros.

Ferro,

Fogo,

e firmamento

Capto as mentes de enxofre
pois tenho olhos de laser
visão de raio x
E o nariz?
Sinto até o aroma que inertiza as narinas carcomidas...
E as suas almas de rio
cheiro impregnado
nos poros da cidade em vexame, moribunda

Os anjos de aço com suas espadas flamejantes circundam a órbita,
pairam no ar,
o céu hoje está cinza,
os homens, loucos, caem vorazmente,
decepcionados com a sua própria crença,
desesperados,
recorrem, quem sabe, a Shakespeare: "-Há mais coisas entre o céu e a terra, Horácio, do que sua vã filosofia."

É tarde!
A humanidade implode graças à sua dúvida,
o último grito e o primitivo, não chega a transcender a sua debilitada existência.
não vai além dos seu rudimentares tímpanos,
jamais chegará ao aguçado ouvido do Universo.

É tarde!
Muito tarde!

Coisa nenhuma subsiste
bem dizia Lucrécia,
mas tudo flui.

Homem, criatura cósmica do Universo,
arauto nômade alado de mistérios-mundos,
do ínfimo átomo manipula a essência,
a mesma idéia dos sóis profundos,
peregrino errante das galáxias - Anjo,
de onde vieste? - Cá para este mundo ...

És maravilhoso, quando és poeta, diabólico, louco, quando muito pensa
a odisséia humana de remota origem
transcrita no espaço e tempo infinito,
transladando séculos (anos luz em sonhos),
habitando o cosmos, ressurgindo ao rito
de um plágio que é a vida,
fascinante enigma transcedental a imagem e semelhança de um mito.

SER DITO POETA
E ESCUTAR ESTRELAS...
- DELAS EXTRAIR POESIA

SER DITO POETA
E CONTEMPLAR O LUAR
E ABSORVER O MAR EM VERSOS

SER DITO POETA
FORMIDÁVEL POETA
E NÃO COMPREENDER OS HOMENS

SER DITO POETA
SENSÍVEL POETA
E NÃO COMPREENDER A SI MESMO

O envelhecimento do meu corpo, do meu rosto,
é a ferida de um punhal terrível.
Como não tenho resignação nenhuma, recorro a ti, óh, Arte da poesia,
que algo sabes de remédios,
na tentativa de embotar a dor com Fantasias e Verbo. A Arte da Poesia
vale até para o poema que não fiz (mas sempre penso), está mais em mim
que muitos (pouco que escrevi)
é o mais inconstante,
indefinido, dos poemas que vivi.
O poema que não fiz
traduz meu mundo,
está implícito ...
único
em meu verso,
já não sei quem sou,
quem ela é,
quem somos
-fundiram-se todos os limites.
O poema que não fiz
sorri comigo e sofre,
e dorme e finge...
pensa a anônima forma
só para não ser,
enfim, subjuntivo.
O poema que não fiz
surge do nada
e conspira a relatividade de tudo (é a razão variável do verbo),
não há palavras,
não há metáforas,
não há gestos,
tinta...
que o descreva.
O poema que não fiz (mas sempre penso),
fecunda a própria poesia
que me seduz a vida inteira.

domingo, dezembro 13, 2009




Círculo vicioso
Bailando no ar, gemia inquieto vagalume:
"Quem me dera que eu fosse aquela loira estrela
Que arde no eterno azul, como uma eterna vela!"
Mas a estrela, fitando a lua, com ciúme:


"Pudesse eu copiar-te o transparente lume,
Que, da grega coluna à gótica janela,
Contemplou, suspirosa, a fronte amada e bela"
Mas a lua, fitando o sol com azedume:


"Mísera! Tivesse eu aquela enorme, aquela
Claridade imortal, que toda a luz resume"!
Mas o sol, inclinando a rútila capela:


Pesa-me esta brilhante auréola de nume...
Enfara-me esta luz e desmedida umbela...
Por que não nasci eu um simples vagalume?"...

(Machado de Assis)
Shine

A lua cheia disse ao vagalume:
- O criticar não é do meu costume,
mas essa tua luz é bem fraquinha ...
e aquele respondeu-lhe:
- mas é minha
A Musa Impassível, de Victor Brecheret.

IMPASSÍVEL

SE A DESGRAÇA É PEDRA, EU SOU UM MARTELO;
EU SOU ÁGUA SE A DOR É FOGO.
NA PROVOCAÇÃO, EU ME FORTALEÇO POIS, COMO A LUA, AO CREPÚSCULO MINHA LUZ AUMENTA.